quarta-feira, 11 de maio de 2011

CANDIDATURA INDEPENDENTE

Uma das questões políticas mais controversas na actualidade é a verdadeira natureza do estatuto dos candidatos a eleições.

Existem dois tipos de candidaturas, a saber:

a) candidaturas apresentadas por partidos políticos, compostas por:
1 - cidadãos filiados no partido.
2 - cidadãos não filiados no partido.

b) candidaturas apresentadas por grupos de cidadãos eleitores, compostas por:
1 - cidadãoes não filiados em partidos políticos.
2 - cidadãos filiados em partidos políticos.

Face à actual lei portuguesa, nas eleições para a Assembleia da República, apenas são admitidas candidaturas de partidos políticos, embora seja permitido que essas mesmas listas integrem como candidatos cidadãos independentes, ou melhor dizendo, cidadãos não filiados nesse mesmo partido.

Já quanto às eleições autárquicas, são permitidas candidaturas dos dois tipos:
1 - Listas apresentadas por partidos políticos, que podem ser integradas por cidadãos filiados e não filiados no partido,
e
2 - Listas apresentadas por um grupo de cidadãos eleitores (e não por qualquer partido) que podem ser integradas por qualquer cidadão, filiado em qualquer partido ou sem filiação partidária.


Desta solução legal resulta um grande leque de possibilidades e consequentes classificações.

Assim, a candidatura do grupo de cidadãos "Independentes pelo Concelho de Abrantes" foi apresentada por um grupo cidadãos eleitores e foi composta por pessoas filiadas em partidos políticos e por pessoas sem qualquer filiação.

No seu conjunto, foi uma candidatura Independente de qualquer partido. Neste caso concreto, os candidatos integraram uma lista composta por pessoas de várias origens partidárias e ideológicas. Foi possível juntar um grande e diversificado conjunto de pessoas com base num projecto para o concelho.

Seria impossível formar um grupo tão abrangente na candidatura de um partido.

Os partidos políticos têm uma lógica de funcionamento que dificulta a composição equilibrada das suas próprias listas. Nuns casos há quem não aceite a participação de determinada pessoa em virtude de discordâncias passadas ou só por ser independente, noutros casos exige-se a participação de uma outra pessoa só por estar ligada à actividade do partido. Num caso como noutro, o mérito é o que menos conta e o resultado é negativo.

Daí que as candidaturas independentes surjam como algo que rasga o véu que encobre a actividade política partidária, atrás do qual se escondem os "homens dos aparelhos" partidários. Estes perdem assim o exclusivo da escolha de quem é ou não é candidato às eleições autárquicas.

Como não podia deixar de ser, este facto assusta os ortodoxos da vida partidária.

Em Abrantes, por exemplo, os aparelhos do PS e do PSD detinham o poder exclusivo de determinar quem seriam os próximos senhores a governar o concelho e os aparelhos do PCP, do CDS e do BE tinham o poder exclusivo de fazer oposição.

Com o aparecimento de listas independentes, estes partidos perderam essa exclusividade e isso foi por eles sentido como uma ameaça à sua influência e aos seus poderes.

De todos os partidos ouvimos desabafos reveladores da insegurança que a candidatura independente provocou e vai continuar a provocar. É natural...

De um facto posso dar testemunho pessoal. As listas apresentadas pelos "Independentes pelo Concelho de Abrantes" nas últimas eleições autárquicas atingiram um nível bastante elevado e foi para mim uma experiência altamente enriquecedora trabalhar com um conjunto de candidatos de tão elevada craveira.

Esta circunstância também torna mais difícil o entendimento entre as pessoas envolvidas. Não se tratou de reunir um grupo à volta de um chefe partidário, não se tratou de juntar um conjunto de "homens de mão", tratou-se, isso sim, de formar uma equipa em que todos, sem excepção, pensam pela sua cabeça e são capazes, em qualquer circunstância, de se bater pelas suas ideias. Este facto começa a ser percebido pelos eleitores.

Penso que num futuro, ainda longínquo, será dada clara primazia às listas apresentadas por grupos de cidadãos independentes nas eleições autárquicas. Não estando em causa escolhas ideológicas nem questões de regime como no caso das eleições nacionais, a lógica aponta no sentido de promover a possibilidade de a escolha dos eleitores se focar mais no grupo de pessoas que se candidata e menos nas siglas partidárias.

Nas últimas eleições autárquicas em Abrantes, se todas as candidaturas tivessem sido apenas candidaturas de grupos de pessoas, o resultado teria sido diferente nalguns aspectos. Esta ideia não belisca a legitimidade democrática dos resultados obtidos por todos quantos participaram. Pretendo apenas explicitar que o peso dos partidos políticos é, em minha opinião, demasiado forte, influenciando o sentido de voto dos cidadãos em função da sua ligação afectiva a esses mesmos partidos em prejuízo de uma correcta apreciação da real valia das pessoas que compõem as listas e do valor de cada um dos programas em confronto.

No caso dos "Independentes pelo Concelho de Abrantes", as listas foram compostas por cidadãos ligados ao PS, ao PSD, à CDU, ao BE e ao CDS. Nuns casos militantes, noutros apenas simpatizantes. Além destes, também integraram as listas cidadãos sem qualquer ligação partidária, nem afectiva nem de militância.
Daqui se retira que uma lista proposta por um grupo de cidadãos eleitores é independente dos partidos na sua formação, na sua hierarquização, no seu projecto, financeiramente e na sua actuação.
Essa independência permite encontrar soluções mais ricas em virtude de ser possível abranger um espectro político muito mais alargado.

Mas também é uma solução muito mais exigente do ponto de vista operacional e das lideranças, obrigando os participantes a serem capazes de encontrar soluções financeiras e de responder pelos seus actos perante as autoridades envolvidas na fiscalização do processo sem terem as costas quentes pelo apoio do Partido quanto a meios e quanto à autêntica loucura que é a obrigatória contabilidade da campanha.

Também por isso, não está ao alcance de qualquer um a apresentação de uma candidatura independente. O simples facto de conseguir chegar às eleições significa que já foi realizado todo um imenso trabalho burocrático e que pelo menos duas pessoas (o primeiro candidato à câmara e o mandatário financeiro) se comprometeram e assumiram "pessoalmente" toda a responsabilidade política, legal e financeira por tudo o que se viesse a passar depois.
Aqui deixo o meu elogio ao Arquitecto Albano Santos e à Dr.ª Fátima Martinho pelo esforçado e irrepreensível trabalho efectuado enquanto primeiro candidato e mandatária financeira dos "Independentes pelo Concelho de Abrantes".

Os detractores das candidaturas independentes deveriam, antes de mais nada, começar por tomar conhecimento das responsabilidades pessoais assumidas pelos respectivos promotores. Tenho a certeza que sabendo o que está em causa teriam uma atitude mais respeitosa, menos primária, em todo o caso menos ignorante.

Não é o facto de uma lista ser apresentada por um partido ou por um grupo de cidadãos que determina a sua qualidade.
É a competência, a capacidade e o mérito das pessoas que compõem a lista que determina a qualidade da mesma. Deve ser o confronto da qualidade das listas concorrentes a determinar a escolha dos eleitores.

Cada cidadão é livre de ter a sua preferência partidária. Essa opção é um direito fundamental e tem que ver com a escolha ideológica de cada um, com o modelo de sociedade que deseja ver implantado.
A ligação a um partido político, afectiva ou de militância, não pode, só por si, impedir ninguém de participar numa eleição local integrando uma lista independente.

Em tese, não está excluída a possibilidade de se apresentar uma candidatura com uma lista de candidatos que sejam todos estritamente independentes, isto é, em que ninguém se sinta ligado a nenhum partido político. No entanto isso parece difícil, para não dizer impossível, uma vez que todos temos as nossas simpatias e antipatias políticas, mesmo quando não somos filiados em nenhum partido político.

Para além de que não poderia ser esse o objectivo da lei que permitiu a apresentação das candidaturas independentes uma vez que isso obrigaria à impossível verificação pelo Estado de que os candidatos admitidos eram "em consciência" independentes...

O que se quis permitir foi a apresentação de candidaturas diferentes das apresentadas pelos partidos.

Para concluir direi que as listas apresentadas por grupos de cidadãos às eleições autárquicas podem e devem integrar pessoas de todas as origens político-partidárias. A adjectivação de Independentes só tem sentido em contraponto às candidaturas apresentadas pelos partidos. É por isso que se chamam independentes.

Carlos Arês

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